
O que esperar de uma gestação e parto na França? Este período, que é simultaneamente belo e desafiador, pode ser vivenciado de maneira mais tranquila e segura. Mas, como alcançar isso longe do aconchego familiar brasileiro? A chave está na preparação; quanto mais informações você tiver sobre a maternidade na França, melhor será sua capacidade de enfrentar os obstáculos e aproveitar o melhor que esse país pode te oferecer. Leia este artigo e fique por dentro!
Quem cuida da gestação e parto na França?
O profissional responsável é a “sage-femme” (mulher sábia) ou o “médecin trataint” (médico de família). O acompanhamento por um obstetra não é tão comum como no Brasil, sendo reservado apenas para casos de complicações durante a gravidez ou parto.
A sage-femme não é médica nem enfermeira, mas uma profissional da área de saúde com regulamentação própria na França. Ela é semelhante a uma doula, mas suas habilidades vão muito além, orientando as gestantes sob seus cuidados desde o diagnóstico até o dia do parto. É de sua competência solicitar ultrassonografias para acompanhar o desenvolvimento fetal, exames de sangue para avaliar os níveis hormonais e identificar complicações potenciais, assim como prescrever medicamentos, se necessário.
Diferentemente do Brasil, o profissional que acompanha a gestante não estará presente no momento do parto, especialmente se ele (a) for independente e sem vínculos com a instituição onde o parto será realizado. Outro ponto importante é que, ao dar à luz em maternidades ou hospitais públicos, não há garantia de que a gestante ficará em um leito sozinha com seu recém-nascido. Normalmente, é oferecido um formulário para solicitação de quarto privativo, com custo médio que pode chegar a até 45 euros por dia.
Por fim, se não receber recomendações de conhecidos, você pode buscar uma sage-femme diretamente no site do Doctolib. Inicie a triagem com base em seu endereço e filtre as opções indicando que é a primeira consulta de gravidez (“première consultation de grossesse”).
Quais são os procedimentos iniciais do pré-natal?
Normalmente a primeira consulta é realizada antes do final do 3º mês, para que o profissional de saúde emita a declaração de gravidez (“déclaration de grossesse”) Este documento é necessário para a restituição dos seus custos futuros. Se esse procedimento não for realizado até a 14ª semana da gestação os pais arcarão com todos os gastos da maternidade.
Portanto, é recomendável que ao saber da gravidez, já esteja registrada na Assurance Maladie, com o número de seguro social e a carte vitale em mãos. Na situação mais desfavorável, se a gestante estiver no país de forma irregular, ela será incluída no programa AME. Contudo, mesmo nessa circunstância, é crucial cumprir o prazo estipulado por lei para a entrega da declaração.
Caso receba algum auxílio social envie a 1ª e 2ª vias (cor azul) a CAF (Caisses d’Allocations Familiales). Em contrapartida, a 3ª via (cor rosa) se destina ao reembolso das despesas médicas a ser enviada para a Assurance Maladie. A saber, leia aqui um post dedicado ao sistema de saúde da França.
Ademais, o quanto antes procure a maternidade da cidade em que reside e faça a sua inscrição (muitas vezes ela pode ser feita online). Esse cadastro é importante para garantir a vaga no momento do parto. Lembre-se que na França o sistema de saúde é essencialmente público, o que acarreta uma sobrecarga da população nas maternidades e hospitais.
Quais exames são solicitados durante a gestação na França?
Na França, conforme site do governo, são realizadas sete consultas obrigatórias ao longo da gestação, começando no terceiro mês e continuando mensalmente até o nono mês. Assim como no Brasil, a gestante fará análises de sangue e urina para verificar o risco de diabetes, hipertensão arterial, toxoplasmose (para as não imunizadas) e avaliar os níveis de TSH. Vamos agora esmiuçar esses exames:
3º mês
Os principais exames incluem a determinação do grupo sanguíneo e RH (no caso de primeira gravidez). Outro exame comum é a análise de sangue para detectar a presença de PAPP-A. Essa proteína faz parte dos testes de triagem pré-natal, visando avaliar condições como a síndrome de Down (trissomia 21).
Ao final do primeiro trimestre, realiza-se a primeira ultrassonografia. Esse exame é fundamental para datar com precisão o início da gravidez e avaliar o desenvolvimento inicial do feto.
5º mês
Ocorre a segunda ultrassonografia, conhecida como morfológica, na qual o profissional avaliará o desenvolvimento fetal e identificará o sexo.
6º mês
A análise laboratorial verificará a existência ou não do antígeno HBs (Hepatite B), os níveis de ferritina (associada a anemia) e hemograma completo.
Além disso, não se preocupe ao solicitarem também o teste de anticorpos irregulares (RAI – Recherche d’Anticorps Irréguliers). Isso é importante para investigar se a mãe possui algum tipo de anticorpo que possa afetar a saúde do bebê durante a gestação.
Outro exame essencial que a sage-femme prescreverá é o teste de sobrecarga oral de glicose, conhecido como HGPO. Durante o exame, ingere-se uma solução concentrada de glicose. Enquanto isso, o profissional do laboratório realizará coletas de sangue em intervalos regulares para verificar o risco de diabetes gestacional.
Por fim, nesse período, a gestante pode se inscrever em um curso preparatório para o parto totalmente reembolsável pela Assurance Maladie.
8º mês
É durante este mês que se realiza uma terceira ultrassonografia. Outra consulta indispensável é com o anestesista. Na França esse encontro é obrigatório, mesmo que deseje dar à luz sem anestesia epidural.
9º mês
A “sage-femme” irá pedir a realização do exame de Pesquisa de Streptococcus do Grupo B para identificar a presença dessa bactéria na região genital da mulher. O streptococcus pode representar um risco durante o parto, levando a infecções graves no bebê.
A última análise de sangue antes do parto verificará a quantidade de fibrinogênio no sangue. Alterações nessa proteína podem provocar coagulação, como pré-eclâmpsia, trombose ou hemorragia pós-partos. Por fim, nessa mesma análise sanguínea verifica se a grávida tem alergia à penicilina.
Na França existe o exame de sexagem fetal?
Primeiramente explico que a sexagem fetal é um exame laboratorial realizado a partir da 8ª semana da gestação que revela o sexo do bebê antes mesmo da ultrassonografia. O técnico coleta sangue da gestante e se identificar o cromossomo Y em suas análises, determina assim o sexo masculino.
No Brasil, as gestantes amplamente utilizam a sexagem fetal e não necessitam de justificativa para isso. Na França, por outro lado, esse exame não está disponível tão facilmente; os profissionais de saúde prescrevem em casos de risco genético associado ao fator do sexo.
Posso optar pela cesariana?
Não, na França, a cesariana é uma exceção. Ela ocorre quando há indicação médica, como no caso de complicações durante a gravidez ou o parto.
Na minha visão, acredito que se as mamães tivessem o direito de escolher a cesariana, isso aumentaria consideravelmente os custos do governo, por isso ela não é uma opção disponível.
A episiotomia é uma prática frequente na França?
A episiotomia consiste no ato de realizar um corte cirúrgico no períneo durante o parto vaginal. A Organização Mundial de Saúde desaconselha essa prática e diversos países têm combatido duramente.
Ressalte-se que não encontrei nenhum índice oficial atualizado, apenas uma enquete nacional de 2021. Segundo esse documento somente 8,3% das gestantes são submetidas a episiotomia. Então, a resposta a essa pergunta seria “não”. Mas, o que percebi é que a cesariana é um tabu no país e que infelizmente os médicos tendem a insistir no parto normal, o que muitas vezes podem causar a necessidade desse corte. Assim, deixo a reflexão para cada um dos leitores, pois nem tudo são flores…
Na França, o aborto é legalizado?
Em 1975, a França legalizou a interrupção voluntária da gestação. No entanto, em março de 2024, essa medida foi oficialmente incluída na Constituição. Além disso, a lei francesa permite o aborto em duas circunstâncias: até a 14ª semana de gestação e por razões médicas durante a gravidez.
Quanto custa o parto na França?
Se a mulher grávida não estiver coberta pelo sistema de seguro social francês, será responsável por todos os custos associados à sua maternidade. Os valores para internação hospitalar podem variar conforme a localidade, porém, em geral, o parto normal custa aproximadamente quatro mil e quinhentos euros, enquanto uma cesariana tem um custo médio de seis mil euros.
O que deveria saber antes de registrar o nascimento do bebê?
Na França, os registros de nascimento incluem apenas o nome de família paterno. Assim, para garantir que seu filho tenha o sobrenome de ambos os pais é necessário solicitar ao Consulado brasileiro o certificado de costume. Por fim, certifique-se de verificar qual consulado, Paris ou Marseille, atua na região onde mora e agende um atendimento com pelo menos um mês de antecedência da data prevista para o parto.
Se eu não falar francês, isso pode ser um problema durante as consultas e o parto?
Sim, pois compreender o idioma será essencial tanto para entender as instruções dos profissionais de saúde quanto para comunicar suas necessidades e preocupações. Recomendo dedicar-se ao aprendizado de palavras, frases e expressões relacionadas à gestação, mesmo que saiba se comunicar em inglês. Se possível, esteja acompanhada de alguém fluente na língua francesa para te acompanhar durante as consultas médicas e no momento do parto.
Como se dá a licença-maternidade francesa?
Embora esse tema mereça um texto próprio, resumidamente, a licença-maternidade na França é concedida a mulheres que trabalham no país antes da gestação. Sua duração varia conforme o número de filhos. Por exemplo, no caso do bebê a nascer ser o primeiro ou segundo filho, a mulher terá direito a 16 semanas, dividindo entre 6 semanas antes e 10 semanas após o parto.
Como são as celebrações dos franceses com a gestação e nascimento de mais um membro da família?
Os franceses costumam ter celebrações mais discretas em comparação com os brasileiros. Não espere eventos como chás de revelação, listas de presentes ou serviços como maquiadores e fotógrafos. Tanto os hospitais como os consultórios costumam ser simples, e o atendimento é direto e objetivo. No entanto, é importante ressaltar que a França conta com profissionais de excelência dedicados a garantir que a gestação e o parto ocorram da melhor forma possível.
Olá,
Obrigada por seu texto, trouxe bastante esclarecimento sobre as práticas relacionadas ao tema na França.
Apenas precisamos atentar ao fato de que o parto cesariano não é saudável nem para a mãe e nem para o bebê, portanto não deve ser incentivado, e deve somente ser realizado em última instância.
A realização de episotomia também não é correta, é na realidade uma violência cometida ao corpo da mulher por médicos que não respeitam o tempo de dilatação e querem apressar o parto.
É necessário a leitura sobre parto humanizado para inclusão de informações acuradas a este texto informativo.
Priscilla, muito obrigada pelo seu comentário.
Esse artigo foi baseado em dados governamentais e também na minha experiência gestacional aqui na França. Infelizmente ela não foi tão humanizada.
Assim como você, penso que a cesariana deve ser o último recurso, tanto que meu parto foi normal. Porém, sou contra a certos procedimentos que levam a exaustão extrema da gestante, por vezes desnecessária.
Irei buscar mais informações sobre parto humanizado, pois realmente não conheço ninguém que tenha feito aqui fora dos métodos tradicionais.
O Brasil em muitos aspectos é mais avançado que a França.
Cordialmente